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Ataxia:

SCA7 (Ataxia Espinocerebelar Tipo 7)

GENES RELACIONADOS:

ATXN7

TIPO DE MUTAÇÃO:

ATXN7 -> Mutação por expansão CAG

LOCALIZAÇÃO:

Cromossoma 3 (3p14.1)

HERANÇA:

Autossômica Dominante

ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO:

15/04/2025 por Márcio Galvão

Conteúdo gerado com apoio de IA Generativa, revisado pelo autor.

Ficha SCA7

1. SOBRE A SCA7

A ataxia espinocerebelar tipo 7 (SCA7) é um dos tipos de ataxias dentro de um grupo de doenças hereditárias do sistema nervoso central. Assim como várias outras ataxias hereditárias, a SCA7 é o resultado de defeitos (mutações) genéticas que levam ao comprometimento de fibras nervosas específicas que carregam mensagens do e para o cérebro, resultando em degeneração do cerebelo (o centro de coordenação do cérebro) [1].

 

A SCA7 é causada por uma mutação expansiva no gene ATXN7, localizado no cromossomo 3p14.1. Essa mutação consiste na expansão anormal de repetições do trinucleotídeo CAG, que codifica o aminoácido glutamina, dentro da região codificadora do gene. Como resultado, é produzida uma proteína ataxina-7 com uma cauda anormalmente longa de glutaminas que se torna tóxica para os neurônios. Esse mecanismo patológico classifica a SCA7 como uma das doenças por expansão de poliglutaminas (doenças polyQ) [4]. Ver 7. Informações Adicionais.

Aspectos Clínicos Distintivos
Além da ataxia cerebelar clássica (disfunção de coordenação, disartria e nistagmo), a SCA7 apresenta degeneração retiniana progressiva, manifestada inicialmente como perda de acuidade visual central (devido a distrofia macular) e evoluindo para retinopatia pigmentar generalizada. Esta é uma característica marcante na SCA7, e tem relação com o fato da proteína ataxina-7 desempenhar um papel importante na transcrição de proteínas por parte de outros genes, inclusive genes específicos da retina.

 

Mais precisamente, a ataxina-7 faz parte do complexo STAGA (SPT3–TAF9–GCN5 acetiltransferase), que está envolvido na modulação da transcrição por meio da acetilação de histonas. A disfunção desse complexo, provocada pela ataxina-7 mutada, contribui para a desregulação da expressão gênica na retina, culminando em degeneração retiniana e sintomas visuais progressivos associados com a SCA7 [8]A perda visual muitas vezes precede os sintomas motores, sendo um marcador diagnóstico precoce (ver 2. Sintomas Típicos).  A Figura 1 mostra um diagrama simplificado da patogênese da SCA7.

Figura 1 - Patogênese simplificada da SCA7 - Imagem gerada pelo autor com apoio de Inteligência Artificial

2025-04-15_155923.png

A SCA7 ilustra a complexidade das doenças neurodegenerativas genéticas, onde alterações em uma proteína multifuncional (ataxina-7) impactam sistemas distintos do corpo (cerebelo e retina). Avanços na compreensão de sua fisiopatologia abrem caminho para terapias genéticas ou para redução da proteína tóxica, embora tratamentos efetivos ainda não estejam disponíveis.

 

Antes da identificação molecular do gene causador da SCA7, os pacientes com essa forma de ataxia eram frequentemente diagnosticados com Ataxia Cerebelar Autossômica Dominante Tipo 2 (ADCA Tipo II) ou com ataxia associada à retinose pigmentar. Atualmente, com os avanços no diagnóstico genético, a condição é corretamente denominada ataxia espinocerebelar tipo 7 (SCA7).

2. SINTOMAS TÍPICOS

A Ataxia Espinocerebelar Tipo 7 (SCA7) distingue-se da maioria das demais formas de ataxia espinocerebelar por incluir, além dos sintomas motores típicos da ataxia, manifestações visuais progressivas causadas por degeneração da retina [6]. É importante destacar que a apresentação clínica pode variar significativamente entre os pacientes mesmo dentro da mesma família, devido a fatores como tamanho da expansão CAG, idade de início e moduladores epigenéticos. Ou seja, nem todos os sintomas ocorrem em todos os indivíduos, e sua gravidade pode oscilar entre leve, moderada e severa.

A heterogeneidade fenotípica é marcante: a presença e a gravidade dos sintomas variam entre pacientes, mesmo dentro da mesma família, devido a fatores como tamanho da expansão CAG, idade de início e moduladores epigenéticos [2].

Sintomas motores 
(comuns a outras formas de ataxia espinocerebelar)

  • Ataxia de marcha e desequilíbrio postural

  • Discoordenação motora dos membros (ataxia apendicular)

  • Movimentos oculares anormais, incluindo nistagmo e diplopia (visão dupla)

  • Disartria (fala escandida ou arrastada) e disfagia (dificuldade de deglutição)

  • Rigidez muscular e espasticidade em alguns casos

  • Disfunções autonômicas, como incontinência urinária, constipação intestinal e outros sintomas relacionados à degeneração de vias espinhais (daí o termo “espinocerebelar”)

Sintomas visuais característicos da ataxia SCA7 (não presentes em outras SCAs):

Os sintomas visuais são causados por uma distrofia progressiva da retina, mais especificamente uma distrofia de cones e bastonetes, que leva à degeneração funcional da retina mesmo quando sua aparência morfológica ainda é preservada nos exames iniciais.

  • Redução progressiva da acuidade visual, que não é corrigível com óculos ou lentes de contato, já que a origem do problema está nas células fotorreceptoras da retina e não em erros de refração.

  • Nos pacientes sintomáticos com SCA7, a retina e o nervo óptico se desenvolvem normalmente, mas com o tempo começam a se degenerar e param de funcionar corretamente. 

  • Escotomas centrais (áreas escuras na visão central), que comprometem tarefas como leitura e reconhecimento de rostos, ou seja, a visão pode ser melhor na região periférica e pior na região central.

  • Fotofobia e dificuldade de adaptação à luz intensa.

  • Discromatopsia (dificuldade na percepção de cores), sobretudo na distinção entre azul e amarelo

 

Notas

1. O processo de degeneração da retina e nervo óptico ocorre em paralelo e de forma parcialmente independente dos sintomas motores de ataxia listados acima. Por exemplo, alguns indivíduos podem ter sintomas leves de ataxia, e sintomas mais severos de perda visual, enquanto outros têm ataxia grave com retinopatia moderada.

​2. No início da doença, a retina pode parece normal (em exames oftalmológicos), embora já não esteja funcionando adequadamente. Isso pode confundir os oftalmologistas, Por este motivo, recomenda-se avaliação por neuroftalmologistas ou especialistas em doenças retinianas hereditárias, dada a complexidade do diagnóstico diferencial (ex.: exclusão de retinose pigmentar não associada a SCA7). Os especiaistas podem solicitar exames mais específicos (por exemplo, OCT - Tomografia de Coerência Optica e Eletrorretinografia (ERG)). Ver Figuras 2 e 3 abaixo.

3. Os sintomas visuais afetam quase todos os pacientes de SCA7 e são inicialmente moderados, mas progridem com o tempo. Muitos pacientes com SCA7 chegam ao estágio de "cegueira legal" pelo critério "20/200" - quando a visão corrigida do melhor dos olhos é de 20/200 ou menos, isto é, a pessoa consegue enxergar a 20 pés (6 metros) o que uma pessoa com visão normal enxergaria a uma distância de 200 pés (60 metros). Isso obviamente cria diversos impedimentos para o paciente (por exemplo, não pode mais dirigir, ler ou reconhecer rostos, impactando qualidade de vida.).

4. Em geral, os sintomas visuais precedem os sintomas motores típicos da ataxia em anos.

ficha SCA7 FIG 1.png

Figura 2 - Retina normal e de paciente com SCA7. A mancha clara é o nervo óptico. 

ficha SCA7 FIG 2.png

Figura 3 - Exame OCT normal e de paciente  com SCA7 . 

3. A IDADE DOS SINTOMAS

De acordo com [3], os sinais iniciais da SCA7 em geral aparecem no final da adolescência ou por volta dos 20 anos, mas a idade do aparecimento dos sintomas pode variar desde poucos meses de idade até mais de 60 anos. Essa variação é fortemente influenciada pelo número de repetições do trinucleotídeo CAG no gene ATXN7. De modo geral, quanto mais cedo os sintomas aparecem, mais rápido a doença progride.  

Existe na SCA7 uma correlação importante entre o número de repetições CAG no gene ATXN7 e a idade em que os primeiros sintomas se manifestam, bem como sua possível severidade [4].

INFÂNCIA

  • O surgimento de sintomas na infância (ver 4. Antecipação) está associado com a existência de mais de 100 repetições CAG no gene ATXN7. 

  • O portal Neuromuscular [3] informa que acima de 200 repetições CAG (em geral com herança paternal) o aparecimento dos sintomas pode ser dar já nos primeiros meses de vida e o curso da doença costuma ser fatal pós dois ou três anos.

ADOLESCÊNCIA

  • O surgimento de sintomas na adolescência ou em adultos jovens (menos que 30 anos) está associado com a faixa entre 60 e 100 repetições CAG. 

  • A manifestação inicial costuma ser visual, com sintomas como diminuição da acuidade visual, fotofobia e escotomas centrais, devido à distrofia de cones e bastonetes.

  • A progressão da doença, embora mais lenta do que nas formas infantis, ainda é considerada acelerada, e pode levar à cegueira e ataxia progressiva em cerca de 10 anos.

ADULTOS

  • Já no caso de menos de 59 repetições CAG a idade de surgimento dos sintomas é em geral após os 30 anos.

  • Os sintomas iniciais são predominantemente cerebelares, como ataxia de marcha, dismetria e disartria, com comprometimento visual surgindo posteriormente.

  • A progressão clínica tende a ser mais lenta e, em alguns casos, menos severa do que nas formas de início precoce.

 

Independentemente da idade de início, a maioria dos pacientes com SCA7 desenvolve, ao longo da evolução, disartria progressiva, disfagia, fraqueza muscular axial e apendicular, e eventualmente acamamento. A perda visual também é universal nas formas sintomáticas, ainda que com tempo de instalação variável.

Nota! Observar que apesar das correlações observadas o número de repetições CAG isoladamente não fornece valor preditivo suficiente para a realização de prognósticos clínicos sobre o curso da doença. Outros fatores genéticos (como alelos modificadores), epigenéticos e ambientais podem influenciar a apresentação da doença. Dessa forma, o valor prognóstico da contagem de repetições CAG é limitado e deve ser interpretado com cautela.  Ver "Faixas de Expansão CAG para a SCA7" na Seção 5. Herança

4. ANTECIPAÇÃO

Na SCA7, a antecipação genética — isto é, o surgimento mais precoce e frequentemente mais grave da doença em gerações subsequentes — é um fenômeno marcantemente presente. Essa antecipação é atribuída à instabilidade da expansão de repetições CAG no gene ATXN7 durante a gametogênese.

A expansão de repetições CAG tende a aumentar na transmissão intergeracional, especialmente durante a transmissão paternal. De fato, a SCA7 é uma das doenças por expansão de trinucleotídeos com maior instabilidade germinativa conhecida, sendo mais propensa a grandes expansões quando o alelo mutante é herdado do pai [5]. 

 

Essa característica pode levar a situações clínicas dramáticas, em que uma criança apresenta sintomas neurológicos severos anos antes que o pai (ou mesmo um avô) venha a manifestar sinais da doença. Nesses casos, o pai pode carregar uma expansão patogênica menor — suficiente para desenvolver sintomas apenas mais tardiamente na vida — enquanto a expansão se amplia significativamente na transmissão para o filho, resultando em uma forma precoce e agressiva da SCA7.

 

Na SCA7, a quantidade de repetições CAG tende a aumentar de uma geração para a próxima, sem que tenham sido reportadas reduções (contrações) no número de repetições CAG na transmissão do alelo com a mutação de uma geração para a próxima [4], embora em outras SCAs isso possa ocasionalmente ocorrer. Isso explica a marcante antecipação que se vê em famílias com SCA7, cuja mutação é a mais instável dentre todas as doenças causadas por expansões CAG anormais. 

5. HERANÇA

A SCA7 é uma doença com herança autossômica dominante. Isto significa que indivíduos de ambos os sexos têm a mesma probabilidade de herdar uma cópia (alelo) do gene com mutação e se tornarem portadores da mutação. Um filho de uma pessoa com SCA7 tem uma probabilidade de 50% de herdar uma cópia do gene alterado (considerando que apenas um dos pais é portador da mutação, ou seja, a mãe ou o pai biológico).

​Observe que é possível que uma pessoa herde uma variante de um gene e não desenvolva a doença (não apresente sintomas), pois pode herdar uma mutação pequena em uma faixa intermediária que tenha baixa penetrância, Porém, quando a mutação herdada está em uma faixa considerada patológica (alta penetrância), a doença vai se manifestar em algum momento da vida.    

Faixas de expansão CAG para a SCA7

​Cada pessoa tem duas cópias do gene ATXN7, uma herdada da mãe, e outra do pai. Um alelo pode ter por exemplo 14 repetições CAG, o que é normal e não provoca doença, enquanto o outro alelo (a outra cópia do mesmo gene) pode ter por exemplo, 72 repetições - e neste caso a pessoa vai desenvolver a doença mais cedo ou mais tarde.

​Os limites de repetições CAG para dignóstico genético da SCA7 são indicados abaixo [4]:

  • Faixa Normal - 7 até 27 repetições CAG. Não desenvolve a doença.  Alelos com ≤27 repetições CAG são estáveis entre gerações.

  • Faixa Intermediária - 28 até 33 repetições CAG. Penetrância incerta. Alguns indivíduos podem permanecer assintomáticos por toda a vida; outros podem desenvolver sintomas muito leves. Pode haver instabilidade germinativa. 

  • Faixa Patogênica: A manifestação ou não da doença depende da penetrância indicada nas subfaixas seguintes.

    • Patogênica com penetrância reduzida  - De 34 até 36 repetições CAG. Risco aumentado para manifestação da SCA7, mas nem todos os portadores desenvolvem sintomas. A penetrância é incompleta.

    • Patogênica com penetrância total - 37 ou mais repetições CAG. Nesta faixa, 100% dos portadores desenvolvem a doença, com gravidade e idade de início correlacionadas ao tamanho da expansão.

Nota: "Autossômica" significa que o gene está localizado em qualquer cromossoma com exceção dos cromossomas sexuais X e Y. Os genes, assim como os cromossomas, normalmente existem em pares (temos um par de cada gene, uma cópia do gene é herdada da mãe, outra do pai).  "Dominante" significa que apenas uma cópia do gene responsável (um alelo) herdada do pai ou da mãe é suficiente para transmitir uma característica física (como a presença de covinhas nas bochechas), ou uma doença genética (como as ataxia hereditárias) de uma geração (pais) para a seguinte (filhos). 

Figura 4 - Fonte: MedlinePlus, U.S. National Library of Medicine.

6. PREVALÊNCIA

A Ataxia Espinocerebelar Tipo 7 (SCA7) é uma forma relativamente rara de ataxia autossômica dominante. A prevalência global estimada é de menos de 1 caso para cada 300.000 pessoas, o que a torna menos comum do que outros subtipos, como SCA1, SCA2, SCA3 (Machado-Joseph) e SCA6. representa em média 2% a 5% de todos os casos diagnosticados de ataxias espinocerebelares no mundo, embora essa proporção varie significativamente conforme a população estudada [7].

 

A SCA7 ocorre predominantemente em dois grupos populacionais raciais: Europeus do norte e africanos.

  • A SCA7 é notavelmente prevalente em certas populações da Suécia, Finlândia, México e África do Sul. 

  • No México, em certas regiões (ex.: Durango), a SCA7 responde por ~85% das SCAs autossômicas dominantes, provavelmente devido a isolamento reprodutivo e alta consanguinidade.

  • Outras regiões com prevalência mais moderada são os Estados Unidos (afrodescendentes), França e Alemanha.

  • A SCA7 é a única doença de repetições de expansão (com exceção da Doença tipo Huntington 2 (HDL2)), que tem um número significativo de indivíduos de ancestralidade africana afetados. Por esta razão, uma fração substancial de indivíduos com SCA7 nos Estados Unidos têm descendência africana.

  • Na Ásia (em países como China, Japão, Coreia do Sul e Índia) e no Oriente Médio a SCA7 é rara (<1% das SCAs).

  • A raridade da SCA7 em algumas regiões do mundo pode ser parcialmente explicada por fatores evolutivos e genéticos, sobretudo a seleção negativa contra alelos muito expandidos de CAG no gene ATXN7.

7. INFORMAÇÕES ADICIONAIS

A ataxia SCA7 é uma das "doenças poliglutamínicas" (PolyQ). Ocorre quando o alelo (cópia) do gene ATXN7 herdado de um dos pais contém uma mutação com uma quantidade anormal de repetições de trinucleotídios CAG (Citosina, Adenina, Guanina), que codificam o aminoácido glutamina (Q) na proteína criada pelo gene. ​Isso faz com que a proteína codificada pelo gene mutante tenha uma conformação anormal, com uma repetição excessiva de glutaminas. Esta proteína anormal tem a tendência de se acumular e formar agregados especialmente nos núcleos nas células nervosas (neurônios). 

A natureza tem mecanismos de proteção para fazer uma "faxina" nas células e quebrar proteínas "problemáticas" ou "desnecessárias" que sejam encontradas. Porém, por algum motivo, estes mecanismos não funcionam bem com estes agregados de poliglutamina, que são insolúveis pelos métodos naturais. Assim, as proteínas defeituosas se tornam tóxicas e podem causar disfunções em processos celulares vitais como a autofagia, a transcrição de DNA, o transporte axonal e a homeostase de proteínas, causando a degeneração e a morte dos neurônios do cerebelo (e de outras células do sistema nervoso). Em função desta perda neuronal surgem os sintomas da ataxia.

Notas adicionais sobre desordens PolyQ: (Adaptadas de "Pathogenesis of SCA3 and implications for other polyglutamine diseases". Hayley S. McLoughlin et al, 2020).

1. Atualmente, são conhecidas nove desordens PolyQ, incluindo a Doença de Huntington (HD), a Atrofia Dentato-Rubro-Palido-Luisiana (DRPLA), a Atrofia Muscular Bulboespinhal (SBMA), e seis tipos diferentes de ataxias espinocerebelares (SCAs), incluindo a SCA1, SCA2, SCA3, SCA6, SCA7 e SCA17. Todas estas doenças decorrem de repetições CAG expandidas nas regiões codificantes de seus respectivos genes, e compartilham outras características comuns. Por exemplo, todas as doenças PolyQ têm herança autossômica dominante (com exceção da SBMA, que é relacionada ao X), afetam principalmente o SNC (Sistema Nervoso Central), embora nervos periféricos e músculos também possam ser afetados, e têm evolução progressiva ao longo de anos. Além disso, em todas as doenças PolyQ existe uma correlação inversa entre o tamanho da mutação (quantidade de repetições CAG) e a idade de início de surgimento (onset) dos sintomas e sua severidade, podendo ocorrer o fenômeno da antecipação como já mencionado. 

2. Nas doenças PolyQ as proteínas mal formadas com excesso de glutaminas (repetições CAG) tentem a se aglomerar formando agregados principalmente nos núcleos dos neurônios, embora também possam ocorrer agregados no citosol (citoplasma) e mesmo agregados distais em axônios. O significado destes aglomerados de proteínas no núcleo das células ainda não é totalmente claro, mas há uma hipótese de que inicialmente este processo seria benéfico (neuroprotetivo), mas com o tempo se torna tóxico (patogênico) para as células nervosas, causando o sequestro de proteínas essenciais para as funções celulares como fatores de transcrição, além de danos nas mitocôndrias, no sistema chaperone (conjunto de proteínas que auxiliam no correto dobramento de outras proteínas), e também no sistema UPS (Ubiquitina Proteassoma) que regula a degradação de proteínas indesejadas ou danificadas, além de prejudicar o processo de autofagia que é parte do mecanismo de "controle de qualidade" de proteínas em nível celular. O reparo de DNA danificado no núcleo das células também pode ser impactado. Todos estes problemas afetam o funcionamento normal dos neurônios, e podem causar a sua morte (perda neuronal). 

3. Além dos neurônios outros tipos de células como as células gliais (astrócitos, microglia e oligodendrócitos) podem desempenhar um papel importante na patogênese das ataxias espinocerebelares e outras doenças PolyQ. Por exemplo, já se sabe que células gliais (glia de Berman) desempenham um papel relevante no processo degenerativo que ocorre na ataxia SCA7, e as mudanças já observadas em células gliais em modelos animais na ataxia SCA1 e na Doença de Huntington bem pode ser uma característica comum em outras doenças PolyQ.

Nota! Estudos recentes sugerem que danos ao DNA estão diretamente relacionados com a perda neuronal (morte de neurônios) na ataxia SCA7.  Pesquisadores descobriram que por um lado, a mutação da proteína ataxina-7 (expressa pelo gene ATXN7) é suficiente para produzir danos ao DNA das células nervosas, e que por outro lado, alguns dos processos naturais de reparo de DNA não funcionam bem por causa da proteína mutante na SCA7. Para mais informações ver artigo SCASource em 10. Referências.

Diagnóstico - O diagnóstico da SCA7 pode ser feito com teste genético molecular (exame de DNA) para detectar mutações (expansão anormal de repetições CAG) no gene ATXN7, sendo recomendado sobretudo se já houver alguém na família com diagnóstico fechado (histórico familiar positivo para SCA7). Antes da solicitação de testes genéticos, o neurologista tipicamente faz exames clínicos neurológicos para análise de sintomas, reflexos, anormalidades oculares, avaliação de histórico familiar etc. e é normal que solicite exames de imagem para verificar se há atrofia cerebelar por exemplo, ou problemas visuais que podem se manifestar na SCA7

Nota: Embora o diagnóstico por teste genético possa ser difícil, demorado e caro, ele é importante, pois permite um melhor aconselhamento genético para os familiares (risco de transmissão da mutação para futuras gerações na família), um melhor manejo da doença, que estará bem determinada, e também possibilita a participação do paciente em ensaios clínicos para medicamentos para ataxias específicas.

8. TERAPIAS E MEDICAMENTOS EM TESTES PARA ESTA ATAXIA

Ver Pipeline de Tratamentos da NAF para a SCA7

Natural History of Spinocerebellar Ataxia Type 7 (SCA7) - ClinicalTrials.gov ID NCT02741440

Está em andamento nos Estados Unidos desde 2016 um Estudo de História Natural para a SCA7 [9], e em maio de 2023 foi aberto recrutamento de mais pacientes com 12 anos ou mais. A previsão de término é Dezembro de 2028. Durante este período os pacientes serão monitorados de perto pelos pesquisadores. O objetivo é coletar dados sobre os problemas neurológicos e de visão que podem ocorrer na SCA7. Os pesquisadores querem entender quais são as mudanças que ocorrem nos olhos e no cérebro de pacientes com SCA7, e como é a progressão da doença. Estas informações são extremamente valiosas para o manejo da doença e para a pesquisa de terapias e medicamentos para a SCA7.  O principal investigador é a Dra. Laryssa A Huryn do National Eye Institute (NEI). O estudo está sendo realizado em Maryland, USA. 

É importante para os pacientes com ataxias em geral, e com SCA7 em particular, que se mantenham atualizados sobre as pesquisas em andamento, e tentem participar de ensaios clínicos se tiverem oportunidade. Há em andamento algumas pesquisas em terapia genética que são promissoras, e estas pesquisas são realizadas tanto por pesquisadores interessados em curas para a ataxia SCA7 (no domínio da neurologia), como também no campo da oftalmologia em geral, onde estão inclusive um pouco mais avançadas (já existem algumas terapias genéticas para alguns tipos de doenças da retina). 

9. TRATAMENTOS

A ataxia SCA7 ainda não tem cura, mas é possível tratar sintomas visando melhor qualidade de vida e fornecer apoio contínuo ao paciente. É importante que os pacientes com SCA7 sejam acompanhados por um neurologista e uma equipe médica multidisciplinar e especializada, com a inclusão gradual de novos profissionais de saúde na medida em que seja necessário em função dos sintomas (geneticista, neurooftalmologista, fisioterapeuta neurofuncional, fisioterapeuta ocupacional, fonoaudiólogo, nutricionista etc.). 

​Seguem algumas recomendações gerais para o manejo de sintomas de ataxia na SCA7:

  • Fisioterapia neurofuncional, exercícios (sobretudo bicicleta ergométrica) e outras atividades físicas regulares (Yoga, Pilates, hidroginástica etc.) são recomendados (dentro das possibilidades de cada um).

  • Para reduzir o risco de quedas em função das dificuldades de equilíbrio ao caminhar pode-se adotar bengalas, andadores ou cadeira de rodas, dependendo do estágio da doença. 

  • Fisioterapia ocupacional e algumas adaptações em casa e nos hábitos diários podem ajudar (ex. instalar barras de apoio nos corredores e banheiros, cadeira para banho, luzes para iluminação noturna, reposicionar os móveis para facilitar a mobilidade, remover tapetes para não tropeçar, utilizar copos com tampa e canudo, calçados com sola antiderrapante e fáceis de calçar etc.). 

  • Descansar sempre que necessário, e é importante ter um sono noturno de boa qualidade. No caso de dificuldades para dormir, consultar o médico, pois há medicamentos que podem ajudar (por exemplo, óleo de Canabidiol).

  • Manter uma alimentação saudável e com boa hidratação.

  • Suplementos e vitaminas podem ser recomendados (consultar o médico para avaliar a necessidade - não consumir vitaminas e suplementos sem supervisão médica).

  • Convém controlar o peso para evitar dificuldades ainda maiores na mobilidade. 

  • Para a disartria, se tal sintoma se manifestar, recomenda-se terapia especializada de fala (fonoaudiologia). Dependendo do estágio pode-se avaliar o uso de dispositivos de assistência para a comunicação (disponíveis para smartphone, computador, iPad etc.). 

  • Para a disfagia, caso ocorra em estágios mais avançados da doença, também se recomenda consulta ao fonoaudiologista - há exercícios que podem ajudar na deglutição, reduzindo o risco de engasgos que possam causar pneumonia aspiratória. 

  • Evitar (tanto quanto possível) o estresse, que em geral piora os sintomas da ataxia.

  • Se necessário, há medicações para o manejo da ansiedade e da depressão. Procurar o médico para avaliar as alternativas mais adequadas.

 

Para os sintomas visuais:

  • Consultar o neurooftalmologista ou especialista em retina para acompanhamento anual de sintomas visuais causados pela SCA7. Apesar de ainda não existir cura para os problemas visuais criados pela SCA7, é importante monitorar outros sintomas visuais que podem ser tratáveis (por exemplo, cataratas, glaucoma etc.). O neurooftalmologista também pode prescrever reforço de algumas vitaminas que têm efeito neuroprotetor. 

  • Optometristas especializados em ajudar pacientes com baixa visão também podem dar boas orientações para melhoria da qualidade de vida. 

  • Existe a opção para os pacientes com SCA7 de frequentar grupos de suporte para deficientes visuais, onde poderão tirar dúvidas e trocar experiências para o manejo das dificuldades visuais no dia-a-dia. 

  • Dispositivos (hardware e software) de auxílio para deficientes visuais também podem ajudar (aplicativos com modelos de inteligência artificial que convertem texto em voz por exemplo, para leitura e narração automática de textos, e também fazem conversão de voz para texto), 

  • Outros recursos como cães guia e aprendizado de linguagem de escrita tátil (Braille). 

Nota! Alguns pacientes com ataxias cerebelares diversas relatam benefícios e melhoria de sintomas de ataxia após sessões de neuromodulação ou estimulação cerebelar não invasiva, por exemplo, a estimulação transcraniana por corrente contínua (tDCS), ou estimulação magnética transcraniana (TMS) com fisioterapeutas certificados. Observar que embora já esteja sendo comercializada esta terapia ainda não foi aprovada pela FDA nos Estados Unidos (ou pela ANVISA no Brasil) para tratamento de ataxias (ou seja, trata-se de tratamento experimental e sem garantias).

Veja informações sobre medicamentos para sintomas de ataxia.

Veja informações sobre tratamentos e cuidados para os pacientes.
Veja informações para quem tem diagnóstico recente
Veja informações sobre Grupos de Suporte para pacientes e cuidadores.

10. REFERÊNCIAS 

As referências abaixo englobam fontes acadêmicas e de organizações especializadas que embasaram as informações desta ficha técnica, incluindo artigos revisados por pares, repositórios genéticos – OMIM, resumos de literatura – GeneReviews, e materiais informativos de fundações de ataxia. Para mais informações, consulte a lista de Referências do ataxia.info

Ref #1

Fonte:

NAF (National Ataxia Foundation)
© Copyright National Ataxia Foundation

Idioma:

Inglês

Data:

Revised NAF - 01/2019

Ref #2

Fonte:

GARD - Genetic and Rare Diseases Information Center. 
Copyright © National Center for Advancing Translational Sciences - National Institutes of Health (NIH) ©.

Idioma:

Inglês

Data:

Last Updated: November 2023

Ref #3

Fonte:

NEUROMUSCULAR  DISEASE CENTER   (Alan Pestronk, MD)
Washington University, St. Louis, MO - USA     

Idioma:

Inglês

Data:

Ref #4

Fonte:

Albert R La Spada, MD, PhD.  
Copyright © GeneReviews. GeneReviews is a registered trademark of the University of Washington, Seattle. 

Idioma:

Inglês

Data:

Last Update: July 23, 2020.

Ref #5

Fonte:

OMIM® - An Online Catalog of Human Genes and Genetic Disorders.
Copyright © Johns Hopkins University.

Idioma:

Inglês

Data:

Edit History: terry : 12/22/2010

Ref #6

Fonte:

Presented by: Dr. Ali Hamedani 

YouTube - Copyright ® National Ataxia Foundation (NAF)

Idioma:

Inglês. É possível habilitar legendas e configurar tradução automática das legendas para outros idiomas.

Data:

Sep 6, 2023

Ref #7

Fonte:

Presented by: Dr. Colleen Stoyas

YouTube - Copyright ® National Ataxia Foundation (NAF)

Idioma:

Inglês. É possível habilitar legendas e configurar tradução automática das legendas para outros idiomas.

Data:

Sep 20, 2023

Ref #8

Fonte:

Written By Dr. Hannah K Shorrock. Edited by Dr. Celeste Suart

SCASource article. Copyright ® National Ataxia Foundation (NAF)

Idioma:

Inglês. É possível habilitar legendas e configurar tradução automática das legendas para outros idiomas.

Data:

September 15, 2023

Ref #9

Fonte:

ClinicalTrials.gov - ID NCT02741440

Sponsor National Eye Institute (NEI)

Idioma:

Inglês. 

Data:

Study Completion (Estimated): 2028-12-31

Por favor, leia o Disclaimer.  

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